segunda-feira, março 21, 2011


O PROFESSOR DE XADREZ

Quando o professor de xadrez ensina as regras básicas aos seus alunos e os coloca para jogar está também os colocando em uma trilha de delicado equilíbrio. Inicialmente o aluno passa de um modo egocêntrico de jogar, elaborando planos e combinações que poderiam ser realizadas se seu oponente não fizesse lances. Aos poucos, vai percebendo que o lado oposto procura obstruir a realização de seus planos. Ele começa a temê-lo, mas não muda de atitude, continua a jogar do mesmo modo egocêntrico, simplesmente desejando que o adversário não seja capaz de invadir seus planos e vencer a partida. Atingi-se assim um ponto crítico e delicado: o espírito de competição de desenvolve. Como evoluir? Neste ponto a interferência do professor é muito importante para controlar esta força, pois se for deixada sozinha, poderá ter conseqüências perigosas. O espírito de competição exagerado pode levar à concentração de todas as energias numa só atividade limitada, negligenciando a evolução homogênea da personalidade. Pode levar, também, a um grande desapontamento que por sua vez pode deixar marcas profundas no caráter da criança, como falta de autoconfiança, acomodação, etc. Por isso, o professor deve motivar o aluno a jogar xadrez por prazer, mais do que para vencer a qualquer custo. Ele deve mostrar a seus alunos a riqueza das variantes e linhas de abertura, a criatividade do meio jogo e a
25 lógica do final. Em poucas palavras, explorar a beleza do xadrez, ao invés de valorizar a efêmera glória da vitória. Usando as palavras de Tigran Petrossian, Grande Mestre Internacional e Campeão do Mundo de 1963 a 1969:
Uma tendência notável no xadrez moderno é a predominância do elemento esportivo sobre o criativo. O fato de hoje em dia o resultado ser mais importante que o conteúdo é nossa infelicidade, uma infelicidade que o público indiscriminadamente aplaude. Eu não posso imaginar que um jogador, genuinamente amante do jogo, possa sentir prazer apenas com o número de pontos marcados, não importa quão impressionante seja o total. (PAIZES, 1974).
Estas considerações levam à seguinte questão: como deveria ser o professor ideal de xadrez? Lasker escreveu no seu manual: el camino a recorrer hacia esta ense anza requiere buenos profesores, unos maestros de ajedrez que sean al mismo tiempo unos genios de la docencia. (LASKER, 1997, p. 350). Palavras de sabedoria de alguém que deseja formar não apenas um forte jogador, mas também um bom cidadão de uma sociedade melhor. Mas como essa combinação perfeita é difícil de encontrar, o que é prioritário? Um professor de xadrez que seja um bom educador ou um forte jogador? Acreditamos que um bom educador que não seja um forte jogador, poderá atrapalhará a evolução do aluno, enquanto que um forte jogador, que seja um péssimo educador, poderá danificar o caráter da criança. Por isso defendemos que o xadrez nas escolas seja ministrado por professores que possuam tanto o suporte pedagógico, como os conteúdos específicos do xadrez. A seguir apresentamos alguns questionamentos válidos para o professor que irá desenvolver um projeto na sua escola.
26 a) Em que medida o estudo e a prática sistemática do xadrez pode contribuir para o desenvolvimento da capacidade cognitiva dos alunos? b) Esse desenvolvimento esperado da capacidade cognitiva dos alunos é suficientemente valioso, do ponto de vista educacional, para justificar o esforço e o custo extra da organização das aulas de xadrez, bem como o tempo despendido? c) Sobre a influência do xadrez na aprendizagem dos alunos: De que tipo? Somente cognitivo, ou também emocional, de atitude ou moral? É esperado em todos os alunos, em muitos, ou somente em poucos? Quanto tempo de estudo e prática do xadrez é necessário para que tal influência na aprendizagem dos alunos torne-se mensurável? É valioso em que termos? Qual escala de valores? É obtido unicamente pelo xadrez, ou também pode ser alcançado por outros meios? Existem efeitos colaterais ou negativos? Quais? d) Sobre as aulas de xadrez: Em quais séries? Em que nível (elementar ou avançado)? Por quais métodos? Como uma matéria obrigatória ou optativa? Atualmente no Paraná diversos cursos de capacitação são ministrados pelo CEX para os professores que desejam ensinar xadrez nas escolas. Nestes cursos, além de trabalhar os conteúdos referentes à técnica enxadrística, buscamos também discutir as questões citadas anteriormente.


JOGOS PRÉ-ENXADRÍSTICOS

Estas reflexões objetivam oferecer alguns recursos metodológicos aos professores de xadrez. Nossa experiência tem indicado que trabalhar com todos os elementos do jogo ao mesmo tempo pode confundir o aluno. Então propomos a seguinte idéia: utilizar jogos mais simples para atuarem como coadjuvantes no ensino do xadrez.

OS JOGOS PRÉ-ENXADRÍSTICOS São todos os jogos que o educador inventar ou adaptar dos existentes, com o intuito de atuarem como facilitadores no processo ensino-aprendizagem do xadrez. Como quase todo jogo pode ser um pré-jogo em potencial, não é do escopo deste trabalho tentar esgotar o tema, sendo que nos limitaremos a apresentar exemplos destinados a fixar conceitos elementares. Cada jogo é utilizado como uma função específica no ensino do xadrez e podemos agrupa-los da seguinte forma: Jogos Pré-enxadrísticos e Objetivos Objetivo Aula inicial Tabuleiro Rei Dama Torre, Bispo e Cavalo Bispo Pré-Jogo Gato e Rato Quadrado Mágico; A Batalha Naval Duelo de Monarcas Desafio das Damas Jogo da Velha Nível F F, F M D F M D, F, M M, M, M
Bispos contra Peões Cavalos Trocados; Corrida do Cavalo; Cavalos Cavalo contra Peões Batalha de Peões; Cavalos contra Peões; Bispos Peão contra Peões F= Fácil, M= Médio, D= Difícil.

Todo aluno quer jogar xadrez com todas as peças desde a primeira aula, então é aconselhável o professor ensinar na primeira aula o movimento das peças e objetivo do jogo e deixar os alunos jogarem. Pode-se também nesta primeira aula utilizar o jogo Gato e Rato. A partir daí pode-se intercalar em cada aula um pré-jogo cujo objetivo é fixar a propriedade cinética e a particularidade de cada peça.

Gato e Rato Regras: 1. Utiliza-se um tabuleiro de 64 casas (8x8). 2. Peças: 4 Gatos e 1 Rato () 3. Os Gatos movem-se de uma em uma casa pela diagonal à frente. 4. O Rato move-se de uma em uma casa pela diagonal à frente e para trás. 5. Não há captura. 6. Os Gatos vencem se bloquearem o Rato. O Rato vence se escapar do cerco dos Gatos. Comentário: Este pré-jogo, cujos princípios são facilmente assimiláveis por uma criança, exercita conceitos que serão úteis no aprendizado do xadrez, tais como a noção de cooperação que deve haver entre as peças; a noção de como o Peão captura; e também noções bastante elementares do que é xeque-mate. Este jogo pode ser ensinado antes de qualquer conteúdo enxadrístico.


Quadrado Mágico Regras: 1. Utiliza-se um tabuleiro de 16 casas (4x4) . 2. Fazer a pergunta: quantos quadrados existem nele? 3. Quem acertar vence. Comentário: A criança poderá ver, através deste exemplo simples, que a primeira impressão não revela toda a informação contida em um diagrama. Deve aprender a ser cautelosa antes de dar um veredicto sobre as posições de partida. Isto será de grande importância para o futuro enxadrista.


Batalha Naval Regras: 1. Utilizam-se dois tabuleiros de 64 casas (8x8) sendo que um será o mapa de tiro () e o outro o seu esconderijo ()


2. Cada jogador possui 8 peças (Tabela 4) que deverão ser escondidas sem que o adversário as veja como mostra a :

Tabela 4 Peças da Batalha Naval Formato Significado Submarino Símbolo S Total 3
Destróier
D
2
Porta-avião
P
1
Hidroavião
H
2
4. Ao esconder suas peças os participantes não devem colocá-las umas tocando as outras. Os Destróieres e o Porta-aviões não podem ser formados pelas diagonais, somente em colunas ou filas. 
5. Disparar três tiros, usando as coordenadas, no esconderijo do adversário, que responderá água se os tiros não acertarem o alvo. Se o disparo acertar um alvo o adversário dirá a coordenada (casa) que foi atingida e o alvo acertado, que será devidamente assinalada no mapa de tiro () do atirador vitorioso. Isto fará com que o jogador que acertou uma parte do alvo, na próxima tentativa busque afundar completamente o alvo, buscando as casas vizinhas da casa atingida, se o alvo for maior que um submarino, naturalmente. Comentário: Este jogo é utilizado para trabalhar o tabuleiro e suas coordenadas cartesianas. Através dele a criança exercitará os conceitos de coluna, fila e diagonal, e estará trabalhando com o plano matricial que será a referência para o nome das casas do tabuleiro de xadrez.


Duelo de Monarcas Regras: 1. Utiliza-se um tabuleiro de 64 casas (8x8). 2. Usam-se 2 reis que se movem como no xadrez e são arrumados como mostra a . 3. O Rei branco inicia o jogo e tem de chegar até a casa a8 ou h8 ganhando assim a partida. 4. Se o Rei negro conseguir impedir o Rei branco de atingir o seu objetivo, terá ganhado o jogo. 5. Não esquecer que um Rei não pode ocupar uma casa contígua ao outro. Comentário: Este jogo tem por objetivo exercitar as particularidades do movimento do Rei, que é uma peça ativa na luta, e o conceito de oposição que é fundamental nos finais de partida.

Jogo da Velha Regras: 1. Tabuleiro de 9 casas (3x3) como na . 2. Cada jogador possui três peças: Torre, Bispo e Cavalo. 3. Os jogadores devem colocar as peças no tabuleiro tentando formar três em linha , como mostra a . 4. Aquele que conseguir dispor suas peças desta forma por primeiro ganha o jogo. 5. Após colocar as peças e não havendo fechado três em linha , iniciam-se os movimentos das peças como no xadrez, e tenta-se fechar a seqüência. 6. Também obtém a vitória o jogador que imobilizar as peças de seu adversário, como mostra a onde o lance é das pretas e estão bloqueadas. 7. Não existe a captura. Comentário: Este pré-jogo é uma adaptação do Jogo da Velha e proporciona um excelente exercício para os movimentos de Torre, Bispo e Cavalo. Após algumas partidas, os alunos não encontrarão mais dificuldades na movimentação destas peças.

Cavalos Trocados Regras: 1. Utiliza-se um tabuleiro de 9 casas (3x3). 2. Fazer os Cavalos brancos trocarem de posição com os pretos. 3. É um quebra-cabeça jogado individualmente. 4. Move-se tanto nos Cavalos brancos quanto nos pretos, podendo-se jogar mais que uma vez com o mesmo Cavalo, e não há captura. 5. Após encontrar a solução deve-se buscar lembra-la. Não há solução em menos de 16 lances. Comentário: Esta atividade exercitará o movimento do Cavalo, mas principalmente a capacidade de planejamento, que é vital no jogo de xadrez. Como esta atividade é difícil, é importante o professor primeiro mostrar a solução para os alunos, antes de pedir que eles resolvam. 

Corrida do Cavalo Regras: 1. Utiliza-se um tabuleiro de 64 casas (8x8) e 1 Cavalo, como na . 2. Deve-se conduzir o Cavalo que está situado em a1 até a casa marcada com o número 1, depois até o número 2, a seguir ao número 3, e finalmente retornar ao ponto de partida. 3. Todo o percurso deve ser feito em 20 lances. 4. O jogador que ultrapassar o número de lances deve refazer o trajeto.
Comentário: Esta atividade reforçará a aquisição do movimento do Cavalo, exercitando no aluno a elaboração de um plano que o ajudará para a condução da partida.

6.1.8 Cavalos contra Peões Regras: 1. Utiliza-se um tabuleiro de 25 casas (5x5). 2. O jogador das brancas inicia com dois Cavalos e o jogador das negras com cinco Peões, que são arrumados como na . 3. As brancas iniciam e os Peões andam de uma em uma casa. 4. O jogador das brancas vence se capturar os Peões. 5. A vitória será das pretas se um Peão atravessar o tabuleiro, desde que não seja capturado. Comentário: Pode-se observar que este jogo encerra um grau de complexidade maior, mas mostra-se muito eficiente no treino do movimento do Cavalo, do Peão e captura.

Bispos contra Peões É o mesmo jogo explicado acima com a substituição dos Cavalos pelos Bispos, colocando um bispo em b1 e outro em c1.

Batalha de Peões Regras: 1. Joga-se em um tabuleiro de 64 casas (8x8). 2. Cada jogador possui oito Peões que são arranjados como na . 3. O jogador com as brancas inicia o jogo sendo que o Peão pode se movimentar como o similar do xadrez, mas sem a captura En Passant. 4. Ganha a partida àquele que fizer um Peão chegar do outro lado do tabuleiro, ou aquele que deixar o adversário sem movimento possível. Comentário: Este jogo visa exercitar o movimento do peão. Sua prática possibilita um melhor domínio do movimento, captura e promoção do peão. Se o professor achar necessário ele pode adaptar este jogo para um grau de dificuldade menor simplesmente retirando os peões das colunas a, b, g e h, ficando uma batalha com 4 peões em cada lado.


O Desafio das Damas Regras: 1. Joga-se em um tabuleiro de 64 casas (8x8). 2. Deve-se colocar 8 Damas sobre este tabuleiro. 3. As Damas não podem estar ameaçadas umas pelas outras como mostra a . Comentário: Este jogo foi originariamente pensado para 8 damas, mas recomendamos que o educador inicie com 4 damas () e progressivamente passe para 5 (tabuleiro de 5x5), 6 (6x6), 7 (7x7), e finalmente 8 damas em um tabuleiro de 64 casas. Esta é uma ótima forma de exercitar o raio de ação longo da dama. Este problema, na versão das 8 damas, tem interessado matemáticos por muito tempo, e pode ser trabalhado em forma de concurso na escola.

Após ter trabalhado com o jogo Batalha de Peões o professor pode pedir que o aluno pratique a partida com os Reis e Peões nas casas iniciais. Paulatinamente o professor acrescenta uma nova peça na sua posição inicial e faz o aluno praticar, sempre com os Peões na sua posição inicial. Assim, após seis partidas, que podem ser jogadas uma por semana, o aluno terá experimentado um pouco das sutilezas de cada peça. A seqüência das partidas pode ser assim: Tabela 5 Partidas Temáticas Aula 1 2 3 4 5 6 Peças Brancas 8 1 +8 1 +2 +8 1 +2 +8 1 +2 +8 1 +1 +8
0 0 0 0 % " 7 ) 5 9 $ ( 4 4 4
Este método é mais demorado, mas tem a vantagem de proporcionar uma melhor compreensão do xadrez.

Peças Pretas 8 1 +8 +2 +8 +2 +8 +2 +8 +1 +8

Texto do professor Prof. Dr. Wilson da Silva
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